Após
assistir o documentário “O Renascimento do parto” e participar de um debate na
universidade, ganhei fôlego para produzir um artigo intitulado A
RAZÃO NASCEU DO ÚTERO: DIREITO HUMANO PELO PARTO HUMANIZADO, já publicado em revista
cientifica. Em homenagem às mulheres destinadas e humanizadas (que com saúde e
as condições psicológicas e físicas permitem podem parir de forma humanizada - normal) um pequeno trecho para reflexão do
artigo produzido.
A
partir da tradição humanitária que se instaurou nas sociedades contemporâneas
fruto da influência judaico-cristã, bem como da moral socrático-platônica, a ideia
de humanização do corpo tem sido fervorosamente concebido como espaço do
sagrado. O corpo expressa a vida, o cuidado com ele remete a transcendência com
a natureza. A sociologia do corpo expressa sua compreensão deste espaço
endógeno do gênero humano, particularmente com o mistério da fisis do feminino com o seguinte
entendimento: [...] o corpo é o vetor semântico pelo qual a evidência da
relação com o mundo é constituída: atividades perceptivas, mas também expressão
dos sentimentos, cerimoniais dos ritos de interação, conjunto de gestos e
mímicas, produção da aparência, jogos sutis da sedução, técnicas do corpo,
exercícios físicos, relação com a dor, com o sofrimento, etc. Antes de qualquer
coisa, a existência é corporal (BRETON, 2007, p.7).
O
cuidado com o corporal, principalmente com a expressão do corpo da mulher começa
no útero, ritualiza-se metaforicamente a expressão humana do gesto de gerar a vida a partir do parto. Trazer
no ventre uma criança transcende o valor supremo da natureza humana, afinal com
este ritual se exercita a perpetuação da vida. De que a vida é gerada, nasce e
se transforma no corpo da mulher e se projeta no mundo.
O
filósofo Emmanuel Lévinas (1906-1996), defensor da questão da alteridade, bem
como da ética que se institui por trás da axiologia do termo em questão, não
propõe uma epistemologia do transcendente, mas propõe uma redescoberta da
filosofia cujo elemento central passa a ser a questão ética e não meramente ontológica,
desse modo, destaca a importância real da relação do homem com o outro. Neste
aspecto, Lévinas ressalta a importância do eu, que possui identidade como conteúdo,
assim seu existir consiste em identificar-se neste mundo, conceituando sua
trajetória a partir do seu existir. A filosofia da alteridade a partir do
filósofo francolituano parte da subjetividade, neste aspecto analogamente é
possível entender sua conceituação para essência da maternidade. A maternidade
é uma metáfora para o feminino, uma expressão para relação do sujeito com o
outro. Assim, a maternidade representa esta substituição, em que o Eu gera em
sim um Outro (LÉVINAS, 2005).
A
mulher que gera um filho no seu frente, constrói a aproximação mais intima
entre seu Eu e a sua cria, uma relação natural ao mesmo tempo convencional do
Eu em relação ao Outro. Meneses (2008) afirma a partir do pensamento de Lévinas
que "a subjetividade maternal fala de uma proximidade que é independente
do saber, da consciência, mas que nasce na vulnerabilidade e na substituição. A
maternidade precede a própria consciência" (MENESES, 2008, p. 159). Ao constatar
que na contemporaneidade as mulheres têm optado pelo procedimento cirúrgico,
com parto cesariano, para dar à luz, se percebe que a sociedade tecnocrática e
mercadológica tem influenciado decididamente as práticas médicas, ao ponto de
nos hospitais privados a taxa de partos pela modalidade cesariana ser
representado por mais de 80% dos procedimentos. Segundo dados da Organização
Mundial de Saúde (OMS) o total de partos cesáreos em relação ao número total de
partos é bastante significativo. Tem-se verificado um acentuado crescimento de
intervenções cirúrgicas para o parto, discrepando com as orientações oficiais
que afirmam por evidências científicas que apenas 15% dos partos necessitam de
procedimentos cirúrgico, sendo aconselhável que os demais 85% que se constituem
de gestações de baixo risco sejam realizadas pelo parto vaginal, popularmente
denominado de "parto normal".
Nestes
procedimentos cirúrgicos ocorre a violência obstétrica. De acordo a pesquisa
intitulada "Mulheres brasileiras e gênero nos espaços público e
privado" (2010, p. 173-174), produzido pela Fundação Perseu Abramo,
constatou que em cada quatro mulheres uma sofre algum tipo de violência durante
o parto. A indicação médica pela intervenção cirúrgica no parto repousa
influencia dos avanços tecnológicos, mas acima de tudo pelo incremento
mercadológico e pelo ritmo frenético dos profissionais da saúde para ocupar
cada vez mais horários de plantões e atendimentos. Neste aspecto, propõe o
discurso dos Direitos Humanos, sob uma perspectiva dos direitos de
solidariedade, um conjunto de ações de valorização do parto normal, humanizado,
inscreve-se entre as reflexões em favor do respeito e valorização da dignidade
humana, quando se trata da questão de reprodução humana e direitos de
sexualidade, o respeito e cuidado pelo corpo feminino.
A
alteridade na maternidade corresponde numa abordagem levinasiana à construção
da subjetividade, quanto a proteção do Outro pelo Eu (LÉVINAS, 2005), em que
está em jogo também a questão do parto. Nenhuma direito humano pode incorre no
erro de deixar de salvaguardar a liberdade de escolha da mulher, no exercício
de sua liberdade, quando se trata de dar à luz a um filho. Assim como na
antiguidade a razão nasce simbolicamente do útero (método socrático), na contemporaneidade o útero
também expressa a linguagem da ética, ao expressar o desejo da vida humanizada, que ocorre a partir da humanização com o parto (natural).
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